domingo, 31 de maio de 2009

Aqui, ali, em qualquer lugar

Sob os lençóis e o cobertor, tentava abafar sua tristeza. Escondia-se do mundo exterior e permanecia tão dentro de si. Pensava o quão triste e aconchegante era permanecer deitada enquanto as lágrimas confundiam-se com a chuva. Queria entender por que o céu chorava e onde ele se escondia. Nas nuvens, talvez, pensou. Desejava estar lá no alto e fazer companhia ao céu escuro estrelado, mas sua timidez não lhe permitiria. O céu era grande demais para ela, as estrelas eram muitas e as nuvens desconhecidas. Ninguém iria tirá-la desse estado deprimente. Fez-se manhã, os passarinhos acordaram, a chuva cessou, as estrelas sumiram aos poucos e o sol apareceu. Ela não conseguia enxergar nada disso, continuava coberta de seus lençóis e o seu doce cobertor, apertando forte o travesseiro como se este fosse alguém a lhe ajudar. E ajudava, enxugava as lágrimas e lhe assoava o nariz. Seu ursinho de pelúcia havia ficado do lado de fora de sua fortaleza, isto lhe deixava mais triste ainda. Pensou em estender um pouco a mão para ver se conseguia alcançá-lo, mas ela estava com tanto medo. Tanto mundo se mexia ali dentro, embora ela não tivesse mexido nem a pontinha do dedinho do pé. Se eu pudesse ajudar, pensei, se eu pudesse... Mas me era impossível. Sentei num canto do quarto e tentei cantar alguma coisa que fizesse com que ela acordasse. Não sabia se estava causando algum efeito. Um raiozinho de sol nasceu em cima do cobertor. Ela não sentia nem frio nem calor. Ela pensava na possibilidade de ficar ali para sempre. Estava tão só. Pensava em como seriam as coisas se ela levantasse. O que estaria acontecendo do lado de fora? Apenas o seu mundo já era tão imenso a ponto dela se perder dentro de si. Motivos ela tinha para ter medo. Mais uma vez, eu estava ali para observar. Do lado de fora... Deste lado fazia um calor tremendo. O ventilador estava quebrado. O teto do quarto parecia descer como se logo, fosse esmagar tudo. Eu poderia ter saído de lá. Mas de certa forma, estava ali para tentar amenizar as coisas. Chegou um momento em que nada mais acontecia e ela percebeu. Começou a levantar seu braço direito com cautela, levantando aos poucos uma pequena parte do cobertor. Estava de olhos fechados. Sentiu um vento inexistente, foi um vento apenas para ela. Talvez tenha se formado pelo movimento que ela mesma fez. Sentiu um alívio. Como se o vento fosse um carinho. Eu queria lhe fazer carinho. Rapidamente abriu um dos seus olhos castanhos e tão belos, que pecado tê-los feito poço todo este tempo. Não o abriu por completo, olhou desconfiada, e aos poucos, pude enxergar o seu olhar totalmente. Não poderia contextualizar a profundidade dele. A primeira coisa que ela viu e reconheceu, foi o seu ursinho, e teve a leve impressão de que ele estava lhe sorrindo. Pode ser que estivesse mesmo, não duvido. Eu estava, com calor, sentada, encostada na parede, lhe sorrindo. Prontamente alcançou o bichinho de pelúcia e jogou de lado uma parte do cobertor. Começou a sentir o calor. Estava melhor, olhando um sorriso. Um sorriso que sorria para ela. O meu ela não via. Mas não sei se a deixaria feliz, então continuei assistindo aquela delicada imagem sorrir aos poucos, aquele aconchegante cobertor ficar para um lado, os lençóis salgados e o travesseiro molhado de lágrimas. Ainda temerosa, sentou, abraçando seu ursinho, encostada no travesseiro e na parede, com o lençol sobre as pernas e o cobertor totalmente afastado. Que olhos. Estavam também cansados. Ela lembrou que não dormira nada. Eu também. Levantei e dei uns passos pelo quarto. Ela olhava o nada e eu a ela. Queria tê-la abraçado, pousar a minha mão sobre o seu corpo. Queria sentir se agora ela estava em paz. Desejei que estivesse. Fui me distanciando aos poucos. Despercebida do começo ao fim. Queria ter estado contida naquele olhar ao menos uma vez, assim como o conjunto dos números reais está contido no conjunto dos números complexos. Era o nada e ao mesmo tempo não o era, pois ela não estava olhando a mim, e continuou a olhar o nada, e eu a ela.

sábado, 9 de maio de 2009

Descrevendo tua ausência

Luzes por todos os lugares. Luzes que me cegam a tal ponto de não conseguir mais enxergar a tua sombra. Estás distante. Distante como a minha terra, longe daqui, eu longe dela, longe de ti. Deixo que mãos me guiem. Mas não há mãos suficientes para me levarem às tuas. Luzes fortes, entre elas tua ausência. Minhas mãos já estão doendo, entre elas tua ausência. Tua ausência, tua ausência, tua ausência. Luzes de natal. Presente. Ausência presente. Eis ela, não tu. As luzes também. Mas são estas luzes que escurecem. Veja bem. Sei que está tarde e quanto mais tarde é mais cedo. Compreende. Entre as luzes, a música, alta, elevando-me. I’m getting high, but this make me feel low. I can’t find you there, I’m getting sic, but I’m fine, I guess. Nem todas as luzes, nem o lugar mais alto. Muito menos a escuridão e meu ponto de partida. Nada disso. Estás no centro, no ponto intermédio. Dá-me as coordenadas. Diz-me se é o teu umbigo. Mostra-me. Os meios, teus seios. Guarda tuas meias e roupas para vestir depois. Desliga as luzes que me cegam, abaixa o som que me eleva, tira-me daqui, leva-me para onde estás, onde quer que estejas. Leva-me para mim e permanece dentro de mim. Grita para que eu possa te sentir não mais distante. Dá-me a tua presença e a certeza. Enquanto neste exato momento, estou pisando em cacos de vidro que refletem ainda mais as luzes da tua ausência. Meus pés não sangram tanto quanto meus olhos. Agora, mais do que nunca, preciso de mãos. As luzes começam a queimar, não a elas. A temperatura do meu corpo sobe e não consigo fazê-la parar. Continuas ausente. Como pode ela ser tão presente? A tua ausência. Faz festa. A tua ausência. Toca. A tua ausência. Eu quero. Tocar. A tua. Presença. Eu não quero festas. A música diz “'Cause if you're not really here, then I don't want to be either, I want be next to you”. Pensei que seria o fim,

mas a música continuou.