quinta-feira, 12 de março de 2009

É como sentir cheiro de flores de manhã cedo. Acordar com o bater das asas de um beija-flor. Beijar a flor. A cama está cheia de pétalas. O beija-flor veio avisar que o dia já amanheceu. A janela estava aberta, ele entrou e saiu. Eu continuei deitada, admirando uma flor. Quis imitar o beija-flor, sem sair.
É como o inverno que passou. A primavera vem logo em seguida. É como milhões de flores nascendo no jardim. Estou entre elas. Posso sentar na grama e conversar com todas elas. Deito na grama e o tempo começa a passar por mim. O tempo passa e as flores passam por mim. Sem me importar para onde vou, deito, sinto o cheiro de uma flor e tanto faz se o chão vai se abrir daqui a um tempo. Pois sei que vai.
Há uma flor em minha cama, e eu não sei muito bem como tocar flores. As pétalas que há, são todas dela. Um novo aroma surge no meu quarto. Desde ontem à noite podia senti-lo fixar-se nas paredes do meu quarto e em cada objeto que possuo. Avisto mais uma vez o beija-flor. Tento afastá-lo da minha.
Continuo sem saber tocá-la, mas ela tão quieta. Como se nada ruim fosse me acontecer caso eu fizer algo errado. O toque de uma flor nunca pode ser errado, para quem sabe o que é uma flor. Disse que eu não entendo de flores, eu mente. Não minto, mas a mente... Que vá para longe.
De uma coisa quero ter certeza. Encho de terra minha cama, encho de água. Quero vê-la florescer nos meus braços. Quero sempre as pétalas a me cobrir. Quero ser terra e água. Quero ser o vaso. Quero puxar a descarga.
É como uma flor seca. A visita do beija-flor que morre. Veio entrar no meu quarto, bateu a cabeça na janela. Cai, decompõe. Um pássaro maior vem a comer os restos. Um gato velho vem comer o pássaro maior. Não quero assistir. Enfia as garras no peito do urubu, cai. Sangram de ambos os lados. Ninguém vence.
É como a luta silenciosa de todos os dias. Como a mudança do belo para o feio. Para o grosseiro, sórdido. Minha cama não passa de velhos lençóis que nunca lavo. E é incrível a dificuldade que tenho para escrever lençóis. Atrapalho-me entre o cê-cedilha e o acento.
Há nada mais e nada mais que nada e nada que eu queira mais. O começo de algo tão diferente do fim. Mas concluo que não devo me preocupar, logo mais estarei ao lado de todos os outros, tão iguais e diferentes. Não questiono mais, o fim não é saber, o fim é não saber. Concluo e desapareço do espaço, perdendo os laços, sentindo o descaso, aliviando-me como uma pedra sendo jogada no rio.
Deve ser tão confortável, afundar e afundar. Chegar ao fim. Se o que querias era agonia, deixa o menino te encontrar no meio de todas as outras. O lançamento perfeito. Seja por alegria, raiva ou falta do que fazer. Levanta a mão, te solta, pedra. Vais para longe, e eu não posso te alcançar. E eu não sei se é o fim, então é.

2 comentários:

delianne lima disse...

já sabes que adorei um dos trechos. E vi selado de onde continuaste. haha

beijo, jogadora de palavras.

Alvim disse...

Admiro quem escreve em prosa... mesmo!